O QUE FAZER?

07-04-2009 Postado em Artigos por Luiz Carlos Figueirêdo

É público e notório que os espaços reservados na mídia em geral, mas em especial na grande imprensa escrita, para discutir a questão da criança e do adolescente no Brasil, tem sido esmagadoramente concedido aos arautos da doutrina de situação irregular, saudosistas e passadistas de um “pseudo” sistema legal que dizia que amparava os menores vítimas da patologia social”, mas que na realidade os empurrava mais e mais para a marginalidade. Desta forma, mentiras ou “meias-verdades” sobre a violência praticada por delinqüentes infanto-juvenis, o aumento do consumo de drogas entre os jovens, e impossibilidade da força policial “prender” os infratores menores de 18 anos; ou que o Estatuto é uma Lei sofisticada para o nosso país e que só serviria para a Suíça, etc., povoam diuturnamente os jornais, as rádios e as televisões brasileiras (de) formando completamente a opinião pública.

Tal como já se fez em várias outras áreas ligadas à questão, é indispensável que se deixe de lado as frases de diagnósticos, lamentação e mesmo denunciação dessa realidade para que, embora cientes da restrição forte, se gere alternativas viáveis de transformação desse quadro.

Esta recomendação implica na necessidade de uma “auto-reflexão – para encontrarmos em nós mesmos alguns preconceitos arraigados com verdades absolutas e que, às vezes, impõe-se reformulá-los no mínimo por não serem tão absolutas assim, como se buscará abaixo demonstrar:

I – Os Meios de Comunicação Pertencem aos “Ricos” e não Defendem Causas Populares – antes de mais nada o dono de qualquer veículo de comunicação é um empresário. Disso decorre que a sua regra de ouro é que a empresa dê lucro. Em especial a grande imprensa não pode alijar qualquer parcela do público potencial. É possível, até, a segmentação ou que se privilegie determinados setores, mas sem fechar os portões aos demais. Penso que este é um ponto absolutamente incompatível com a teoria de luta de classes. Não aceitar isto é querer se passar uma esponja na história mundial do século XX, onde grandes temas populares foram capitaneados pela imprensa, principalmente jornais. Tudo o meio de comunicação tem uma “linha editorial” fixada pelos proprietários, mas estes, normalmente, não vivem diuturnamente dentro das empresas. Os diretores e editores é que assumem a tarefa de compatibilizar a esta linha editorial as notícias que faça, do seu veículo um sucesso de público e de anunciantes para assegurar o lucro; há portanto, espaços para divulgar todas as causas. Falta achar os caminhos para incorporar nossas propostas na mídia;

II – A Imprensa não Veicula “nossas’ Noticias – É sabido por todos que para “vender” o produto pelo “homem que mordeu o cachorro e não pelo cachorro, que mordeu o homem”. Entretanto, por mais sensacionalista que seja um determinado veículo de comunicação, não pode ele sobreviver só com os fatos explosivos. Toda a imprensa tem uma pauta e precisa de fatos para noticiar. Disso decorre a antecedência os eventos, sugestões de entrevistas, assim como um rigoroso exame de conteúdo e forma dos “press-realeses” produzidos. As vezes, mesmo que este esteja bem feito não se deve remetê-lo a determinado veículo (por exemplo: encaminhar a um jornal católico um artigo – por mais fundamentado que seja – defendendo o aborto, o divórcio, a pílula anticoncepcional, a pena de morte, o fim do celibato dos padres, etc.), quando isto ocorre nem esta notícia é divulgada e se gera uma “barreira’ para entendimentos futuros;

III – Os dirigentes são inacessíveis – É lógico que, pelas suas próprias ocupações, estas pessoas não estão disponíveis para contatos a qualquer hora. Não acho que seja necessário muitos encontros com estes dirigentes. É fundamental um primeiro contato – talvez único – por assim dizer “político”, onde as idéias e propostas sejam lançadas e discutidas. Daí por diante os entendimentos podem ser feitos diretamente com a “tropa”. Assim pode ser solicitado uma audiência formal para tal conversa, sem prejuízo de um trabalho no sentido inverso – de baixo para cima – divulgando as idéias de movimento. É preciso não se esquecer que, exatamente por terem origens sociais, econômicas, escolares, etc., similares, os opositores da doutrina da proteção integral já detém, pelas próprias circunstancias, a facilidade de acesso aos editores, dirigentes e empresários, o que explica na facilidade de veiculação das “notícias deles”, muito mais do que a visão da causa dos ricos, embora, em alguns casos, essa idéia possa vir subjacente e sendo ardilosamente manipulada por determinados “fariseus” da defesa dos “interesses do menor”;

IV – Os jornais não se Comprometem e não Ajudam – Em primeiro lugar o jornalista é profissional. Nestas condições pode ele ser simpatizante, mas não militante de uma causa. A militância é fruto da cidadania e do engajamento da pessoa com uma determinada proposta, nada tendo a ver com o exercício profissional. Além disso, às vezes, alguns deles também introjetaram os preconceitos antes mencionados, sem uma análise mais profunda, e, “com medo de perder o emprego’, preferem manter-se silentes, amorfos, inodoros e incolores, apenas cumprindo o que lhes mandam, sem nada propor ou questionar. Não sabem eles que, embora às vezes se sirvam deste seu traço de personalidade, em geral tal postura não agrada a seus chefes que, ao contrário, “venceram na vida” pela ousadia, criatividade e perseverança.

Não bastasse isso, é preciso se terem mente que “ninguém pode amar aquilo que não conhece”. De tal constatação revela a necessidade de se promover, em convênio com instituições próprias da imprensa – A.B.I., Sindicatos de Jornalistas, ABERT, etc., Cursos, Encontros e Palestras para intercâmbio de experiências, com criteriosa escolha dos expositores de lado a lado para não se correr riscos de ampliar o fosso existente;

V – Não Existe Meios de defesa contra Inverdades Publicadas – Jamais se recomendaria uma briga sistemática com a imprensa, pois seria a mesma coisa que se ir tentar deter com as mãos um trem em movimento. Além disso, estaria se negando os itens anteriores, que, fundamentalmente, defendem a idéia da existência de um ótimo espaço para negociação e entendimentos, não se recomendando o pessimismo, a radicalização ou confronto puro e simples. Todavia, sabe-se da existência de alguns focos de resistência quase que totalmente impermeáveis, encontráveis nos noticiários policiais matutinos das rádios e nos jornais que espremendo sai sangue por todo lado. Quando uma determinada pessoa, instituição ou idéia já sedimentada tem um grau muito elevado de credibilidade na opinião pública, normalmente não vale a pena invocar a Lei de imprensa para, no mesmo espaço, rebater inverdade contra si assacadas, pois apenas se estará mantendo o agressor nas “manchetes’, já que a própria população rechaçará o ataque, não lhe dando qualquer crédito. No caso da luta em prol da criança e do adolescente, como os defensores da outra doutrina, em geral, são pessoas bem vistas, e como a nova visão deste grupo ainda não sedimentou na cultura da sociedade, sem se falar que a leitura “antiga” incutida na mente do povo da “Lei de Talião” é a base filosófica desses “noticiários”, faz-se indispensável o uso deste instrumental, que é democrático, para controlar eventuais abusos. O bom senso é que determinará os casos concretos em que tal deva ser feito e em quais limites, para não se obter uma resposta da opinião pública exatamente contrário da esperada, pois um nenhum lugar do mundo, o uso indiscriminado do método “bateu, levou!” pode dar certo.

Faço, ainda, dois comentários que julgo importante para reflexão junto com os pontos antes abordados: primeiro, que é preciso que todos se conscientizem que agora “ilegal são eles’, pois as nossas idéias foram incorporadas ao ordenamento jurídico vigente, donde não nos cabe mais permanecer no exercício do “jus esperniandi” se não quisermos ficar iguais aos governantes que assumem seus cargos mas não descem do palanque de campanha. Segundo, que tem de se ter em mente o princípio de “não faça da imprensa uma arma, a vítima pode ser você!” é atualíssimo, decorrendo que “vedetismos” e “estrelismos” de alguns que não podem ver uma câmara de TV, microfone, gravador ou um repórter, ou que se acham habilitados a “entrevistas” sobre todo e qualquer assunto, já que são “especializados” em todos os múltiplos temas tratados no Estatuto, ou a prática predatória de se “atirar pedras” em instituições que são companheiras e parceiras em muitas lutas, Embora com algumas divergências o democrático – fazem muito mais mal à causa do que os aqueles vindo dos adversários ou editoriais da imprensa.

Luiz Carlos de Barros Figueirêdo
Publicado na Folha de Pernambuco – 08/92.

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