Apelação Cível nº. 0122938-5 (2ª Vara da Fazenda Pública da Capital)

16-04-2009 Postado em Decisões e Votos por Luiz Carlos Figueirêdo

Sétima Câmara Cível
Apelação Cível nº. 0122938-5 (2ª Vara da Fazenda Pública da Capital)
Apelante: Maurício de Abreu Pinto e OUTROS
Apelado: Estado de Pernambuco
Relator: Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação Cível interposta por Maurício de Abreu Pinto e OUTROS contra sentença de primeiro grau (fls. 131/133) que, proferida à vista do julgamento da Ação Ordinária de indenização por danos materiais e morais c/c pedido de antecipação de tutela oposta contra o Estado de Pernambuco, julgou improcedente o pedido de indenização, “(…) posto que não configurados nos autos a culpa de servidor público pelos danos e o nexo causal entre a ação ou omissão do agente, elementos necessários para caracterizar a responsabilidade do Estado (…)”.

Os Apelantes sofreram a morte do filho de vinte anos, supostamente assassinado por policiais militares, numa investida contra o furto de madeirites na praia de Boa Viagem, onde estava a estrutura do Recifolia.

Consta nos autos que Marcel de Abreu Silva, filho dos apelantes, encontrava-se juntamente com outros dois amigos (Ronnie e Inaldo), por volta das 02:30 h do dia vinte e oito de outubro de 1997, recolhendo madeirites ao logo da areia da praia de Boa Viagem, no bairro do Pina, quando, já dirigindo-se às suas residências, na altura da Rua Capitão Ribelino, foram surpreendidos por uma guarnição da policia e fugiram correndo, deixando para trás a carroça com os madeirites. Que os policiais já chegaram atirando e um dos tiros teria atingido Marcel pelas costas quando este tentava pular o muro de uma casa.

Consta, ainda, que antes da abordagem do grupo onde Marcel se encontrava, uma viatura com as mesmas características discriminadas pelos amigos de Marcel (viatura tipo camburão com xadrez, modelo D-20), teria abordado dois rapazes que empurravam uma carroça com lavagem (resto de comida), que recolhiam dos bares e restaurantes em Boa Viagem. Segundo o relato de Ionaldo os policiais, empunhando armas, perguntaram sobre os madeirites e eles responderam que não sabiam do que estavam falando, já que trabalhavam com lavagem. Após tal abordagem, estes teriam ouvido tiros nas imediações onde a viatura se dirigiu. Em seguida, encontraram a vítima baleada ainda com vida.

Conforme consta em vasta documentação, foi instaurada sindicância (fls. 44) por determinação do Comandante do BPRp (Batalhão de Polícia da Rádio Patrulha), com a finalidade de apurar a denúncia da suposta participação de policiais militares no assassinato de Marcel, fazendo constar do rol dos investigados os policiais que estavam de serviço na madrugada do dia 28/10/97, nas proximidades do local do crime. Nas conclusões do seu relatório, consta que as testemunhas disseram não poder reconhecer os policiais militares acusados, bem como, identificar a viatura que conduziam, com parecer para o arquivamento da sindicância por falta de provas. Sindicância arquivada, conforme fls. 69.

Foi remetido inquérito policial à justiça sob o nº 222/97 (fls. 70), no entanto, sem a identificação da autoria do assassinato de Marcel, morto por projéteis de arma de fogo.

A sentença recorrida julgou pela improcedência do pedido de indenização por danos materiais e morais pela ausência de provas.

Irresignados com a sentença de 1º grau os autores interpuseram recurso de apelação (fls. 136/138), alegando que “restou provado que o recorrente, através de testemunhas e documentos teve seu filho vitimado por policiais militares, que tinham inclusive a obrigação legal de ter chegado aos culpados, mesmo que estes policiais não estivessem oficialmente atuando na área. Esta responsabilidade é do poder público”.

Apelação recebida em duplo efeito (fls. 139).

O recorrido não apresentou suas contra-razões, conforme certidão de fls. 141.

Parecer da Procuradoria de Justiça às fls. 157/160 dos autos, onde opina o Parquet “pela reforma parcial da sentença, a fim de julgar parcialmente procedente o pedido, com a condenação do Estado de Pernambuco ao pagamento de indenização por danos morais em favor dos apelantes, com fulcro nos artigos 5º, V e X e 37, § 6º da Constituição Federal (…)”

É o relatório.

À revisão.

Recife, ___ de _________ de 2007.

Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo
Relator

Sétima Câmara Cível
Apelação Cível nº. 0122938-5 (2ª Vara da Fazenda Pública da Capital)
Apelante: Maurício de Abreu Pinto e OUTROS
Apelado: Estado de Pernambuco
Relator: Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo

VOTO

No mérito, tenho que a decisão recorrida merece ser reformada.

A matéria versa sobre a responsabilidade civil do Estado pela morte de cidadão vitimado supostamente por policiais militares, em perseguição por uma possível prática de furto. A vítima encontrava-se com mais outros dois rapazes que conseguiram fugir da perseguição dos policiais, porém não obteve o mesmo sucesso, pois ao pular o muro de uma casa nas proximidades do local, foi alvejado com um tiro pelas costas.

O Estado atua através de seus agentes, em razão disso o ato praticado por estes no desempenho da função ou em razão dela, é de responsabilidade da Administração Pública. Pela teoria do risco administrativo, adotada pelo nosso sistema jurídico-constitucional, a pessoa jurídica de direito público responde sempre pelos atos de seus agentes, uma vez que se estabeleça o nexo de causalidade entre o ato da Administração e o prejuízo sofrido, não se cogitando se houve ou não culpa, para concluir pelo dever de reparação. A regra do § 6º do artigo 37 da Constituição da República é a seguinte:

“Parágrafo 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Vejamos o que diz a doutrina a respeito:

“Em apertada síntese, a teoria do risco administrativo importa atribuir ao Estado a responsabilidade pelo risco criado pela sua atividade administrativa. Esta teoria, como se vê, surge como expressão concreta do principio da igualdade dos indivíduos diante dos encargos públicos. É a forma democrática de repartir os ônus e encargos sociais por todos aqueles que são beneficiados pela atividade da Administração Pública. Toda lesão sofrida pelo particular deve ser ressarcida, independentemente de culpa do agente publico que a causou. O que se tem que verificar é, apenas, a relação de causalidade entre a ação administrativa e o dano sofrido pelo administrado”. (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007)

Muito embora a sindicância e o inquérito não tenham conseguido individualizar o(s) sujeito(s) causador(es) do dano, restou demonstrado pelos testemunhos colhidos, que foi a ação de policiais militares que resultou na morte de Marcel. Ademais, é de se reconhecer que a polícia tinha meios de aprofundar a investigação e um pouco mais de dedicação na coleta dos dados poderia se chegar à identificação da viatura que esteve naquele local e conseqüentemente aos ocupantes dela. A despeito do fato de atribuírem à vítima o crime de furto, não se justifica o desfecho da ação policial, pois a atividade da polícia militar deve ser pautada pelos ditames legais que não permite o julgamento sumário nem tampouco a pena de morte.

A individualização do sujeito do ato ilícito é matéria de processo penal, cabendo à policia judiciária, ao Ministério Público e ao Judiciário a função exclusiva de apurar a materialidade e a autoria do crime e aplicar as penas cabíveis. Não se pode transferir a atividade estatal para as mãos dos cidadãos, como sugere o Estado recorrido, quando alega que os recorrentes não provaram, através do reconhecimento dos policiais envolvidos e a identificação da viatura, a autoria do crime. Essa é uma função exclusiva do Poder Estatal, não sendo admissível atribuí-la para o cidadão comum, que no mais atua no processo como colaborador da justiça, através dos depoimentos pessoais.

No âmbito do processo civil, sobretudo quando se trata da responsabilidade civil do Estado, basta a comprovação do nexo causal entre a ação ou a omissão do agente público e o dano. Os argumentos de que não existia viatura a serviço no local do crime pelo fato de não haver nenhum comando ou registro oficial para atuar nas proximidades do ocorrido, não exclui a possibilidade de ter havido uma ronda no local por viatura que passava pelas imediações, a exemplo da viatura de prefixo 3800, que trabalhava no turno de 19:00 às 07:00, no setor de Boa Viagem, conforme planilha de fls. 57. Se o excesso da atuação dos policiais se deu à revelia do comando da Radio Patrulha, esse fato não afasta a responsabilidade do Estado, pois agiram na condição de policial militar, inclusive em viatura oficial, conforme consta dos depoimentos das testemunhas.

Outro argumento trazido pelo Estado recorrido (fls. 84) é a possibilidade da polícia militar ter agido em legitima defesa própria ou em legitima defesa da ordem jurídica. Ora, a legitima defesa permitida pelo ordenamento jurídico deve pautar pela razoabilidade dos meios empregados que devem ser proporcionais ao perigo eminente. Pelo que consta, tanto a vítima como os outros integrantes do grupo perseguido a tiros pela policia militar não se achavam armados, nem reagiram de forma a oferecer perigo, pelo contrário, correram para se defender dos tiros que eram disparados. Tanto é verdade que o tiro que vitimou Marcel foi dado pelas costas, prova da covardia de quem usa a farda para intimidar os mais fracos.

As hipóteses de exclusão da responsabilidade do Estado não integram a defesa do recorrido, o qual não demonstrou que o fato foi de exclusiva culpa da vítima, oriundo de caso fortuito e força maior ou ainda decorrente de fato exclusivo de terceiro. Somente uma dessas hipóteses poderá excluir a responsabilidade do Estado, a teor do que leciona a doutrina moderna:

“Com efeito, a teoria do risco administrativo, embora dispense a prova da culpa da Administração, permite ao Estado afastar a sua responsabilidade nos casos de exclusão do nexo causal – fato exclusivo da vitima, caso fortuito e força maior e fato exclusivo de terceiro. O risco administrativo, repita-se, torna o Estado responsável pelos riscos da sua atividade administrativa, e não pela atividade de terceiros ou da própria vitima, e nem, ainda, por fenômenos da Natureza, estranhos à sua atividade. Não significa, portanto, que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular.” (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade civil. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007)

Acerca da aplicação da teoria do risco administrativo e a conseqüente responsabilidade objetiva do Estado, veja-se o entendimento jurisprudencial desta Corte de Justiça:

“EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ATO ILÍCITO. DISPAROS EFETUADOS POR POLICIAIS NO INTERIOR DE ÔNIBUS COLETIVO. DANO MORAL E MATERIAL REDUZIDOS. PENSÃO MENSAL. PROVIMENTO AO REXAME NECESSÁRIO. APELO PREJUDICADO. 1. Pela teoria da responsabilidade objetiva adotada pelo nosso sistema jurídico-constitucional, a pessoa jurídica de direito público responde sempre pelos atos comissivos de seus agentes, uma vez que se estabeleça o nexo de causalidade entre o ato da Administração e o prejuízo sofrido, não se cogitando se houve ou não culpa, para concluir pelo dever de reparação.2. No caso em apreço houve um ato desarrazoado praticado pelos agentes públicos ao efetuar disparos contra um veículo coletivo repleto de passageiros para realizar a prisão de cinco indivíduos. Pela análise dos autos, cuida-se o caso de ato ilícito do Estado em promover ações eficazes e seguras, sobressaindo o dano ao apelado e restando claro o nexo de causalidade entre a ação policial e o dano causado, que enseja a responsabilidade objetiva do Estado e conseqüente indenização.3. Alega o apelante que não houve comprovação de que a vítima efetivamente promovia o sustento dos apelados, sendo indevido o dano material. Entretanto, pelo que se depreende dos autos, existia esse vínculo, bem como a situação sócio-econômica da família, aliada a relação de parentesco, configura a existência de ajuda financeira por parte do filho. Todavia, o montante mensal estipulado pelo Juízo a quo deve ser revisto, uma vez que, se o apelado percebia aproximadamente dois salários mínimos, não é correto afirmar que enviava integralmente o valor para os apelados, sob prejuízo do próprio sustento. Dessa forma, deve ser reduzido dano material para um salário mínimo mensal, até quando a vítima completasse 65 anos. 4.Em relação ao dano moral, levando-se em consideração os Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade, cuido que o montante deve ser reduzido para R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais), valor médio fixados pelos Tribunais Superiores em casos semelhantes.5.Os honorários advocatícios devem ser fixados no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor final da condenação.6.À unanimidade deu-se provimento ao reexame necessário, prejudicado o apelo.”
(Apelação Cível 135851-8 Recife 0100167715 Relator José Alexandre de Vasconcelos Aquino 8ª Câmara Cível 1/6/2006 14:00 Publicação 204)

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÃO DO RITO SUMÁRIO. AUDIÊNCIA UNA. INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. SENTENÇA. ARGÜIÇÃO DE NULIDADE. AUSÊNCIA DE PROPOSTA CONCILIATÓRIA. IRRELEVÂNCIA NO CASO CONCRETO. COMPARECIMENTO DO RÉU. APRESENTAÇÃO DE CONTESTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DAS PROVAS. SUFICIÊNCIA NA OUVIDA DOS TESTEMUNHOS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. VEÍCULO OFICIAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA CONFIGURADA. PROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DO JULGADO. Preliminares. 1. Em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas, que caracteriza o processo civil moderno, não se deve declarar nulidade processual que a lei não haja expressamente cominado, quando a parte que a argúi não demonstra a ocorrência de qualquer prejuízo processual, em concreto. 2. A oportunidade para a parte juntar documentos no procedimento sumaríssimo é na contestação. 3. O Juiz, em nosso ordenamento jurídico, é livre na apreciação das provas, não devendo permitir a produção daquelas que serão inúteis e somente trarão atrasos à marcha processual, especialmente quando se trata de ação em rito sumário, como no caso dos autos. Mérito. A responsabilidade objetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento lícito ou ilícito que produziu uma lesão na esfera juridicamente protegida de outrem. Para configurá-la basta, pois, a mera relação causal entre o comportamento e o dano, eximindo-se o Estado de indenizar tão somente pela força maior ou a culpa exclusiva da vítima. Apelo a que se nega provimento. Decisão unânime.”
(pelação Cível 114482-3 Recife 0300001795 Relator Luiz Carlos Figueirêdo 7ª Câmara Cível 6/2/2007 14:00 Publicação 50)

“EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. ATROPELAMENTO DE MENOR. MORTE. VEÍCULO DE PROPRIEDADE DE SECRETARIA ESTADUAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. Art. 37, §6º, CF/88. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA DE CAUSA EXCLUDENTE OU CONCORRENTE DE CULPABILIDADE A MINORAR O “QUANTUM” INDENIZATÓRIO DEVIDAMENTE ARBITRADO PELO JULGADOR “A QUO”. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA QUE SE CONFIRMA PELOS SEUS PRÓPRIOS TERMOS E FUNDAMENTOS JURÍDICOS. DECISÃO UNÂNIME PELO IMPROVIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO, RESTANDO PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO. Em se tratando de responsabilidade objetiva do estado, art. 37, §6º, CF/88, prescinde a comprovação da culpa do agente, cabendo tão somente à parte interessada demonstrar o ato, o dano e o nexo de causalidade com a conduta do agente público para que reste o dever estatal de indenizar. Morte de vítima menor transportada dentro de veículo de propriedade de Secretaria Estadual. Dever de indenizar do Estado incontestável, quanto mais diante das provas produzidas nos autos, que afastam qualquer possibilidade de causa excludente ou minorante de responsabilidade. Indenização por danos morais arbitrada em patamar razoável, observadas a natureza sancionadora e compensatória dessa indenização. Manutenção do julgado que se impõe pelos seus própios termos. Reexame necessário improvido, prejudicado o recurso voluntário. Decisão unânime.”
(Apelação Cível 74389-3 Recife 9200536030 Relator Luiz Carlos Figueirêdo Revisor João Bosco Gouveia De Melo 7ª Câmara Cível 29/8/2006 14:00 Publicação 172)

Nesse mesmo sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme julgado a seguir:

“EMENTA: ADMINISTRATIVO – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – ATO OMISSIVO –MORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL INTERNADO EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DO ESTADO.
1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto.
2. Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima.
3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto.
4. Falta no dever de vigilância em hospital psiquiátrico, com fuga e suicídio posterior do paciente.
5. Incidência de indenização por danos morais.
7. Recurso especial provido.”
(REsp 602102 / RS 2003/0192193-2 Relator(a) Ministra ELIANA CALMON (1114) T2 – SEGUNDA TURMA 06/04/2004 DJ 21.02.2005 p. 146LEXSTJ vol. 187 p. 166 RNDJ vol. 65 p. 127 RT vol. 836 p. 151)

Pelas circunstâncias que se deu o ocorrido e pelas provas acostadas, ainda que exclusivamente testemunhais, verifica-se a presença de indícios veementes, a exemplo da descrição do carro, por todas as testemunhas ouvidas, que se tratava de uma veraneio preta (D-20, tipo camburão com xadrez), de uso exclusivo da Rádio Patrulha, sendo razoável concluir a existência do nexo causal entre a ação dos policiais militares, mesmo na impossibilidade de individualizar o sujeito da ação, e o dano, o qual enseja a responsabilidade do Estado em indenizar. Quanto ao testemunho sobre a arma utilizada por um dos PM’s, é fato público e notório de que policiais militares portam pistolas, mesmo não sendo esse tipo de arma usada na unidade.

Neste caso, firmado o entendimento pela responsabilidade do Estado, resta verificar a extensão dos danos causados, ou seja, os danos materiais e/ou os danos morais.

Em relação aos danos materiais, em conformidade com o parecer da Procuradoria de Justiça (fls. 157/160), entendo não haver comprovação nos autos sobre a dependência econômica dos apelantes em relação à vitima, nem se esta efetivamente exercia atividade laborativa, não sendo razoável arbitrar indenização nesse sentido.

Quanto aos danos morais é indiscutível a dor pela perda de parente (filho) vitimado de forma brutal aos vinte anos de idade, porém deve-se levar em conta as circunstâncias em que se deu o fato, ou seja, a vítima estava sendo perseguida pela prática de furto, sendo certa sua fuga do local ao deparar-se com uma viatura policial. Nesse caso, entendo razoável o arbitramento dos danos morais no patamar de 100 salários mínimos, vigentes à data do pagamento, tendo como parâmetros o nível sócio-econômico das partes, a gravidade da lesão, o efeito sancionatório da medida e as circunstancias do fato, não caracterizando enriquecimento sem causa.

Como mostra Carlos Alberto Bittar, a reparabilidade do dano moral assenta-se mais no sentido de que o pagamento em dinheiro, ao invés de objetivar uma recomposição do desequilíbrio causado pelo fato lesivo, representa uma sanção ao causador do fato, sanção essa que pode traduzir-se em dinheiro (Reparação civil por danos morais, 2. ed., p. 63), lembrando-se o ensinamento do ilustre jurista:

“Frisa-se, ademais, em caso de fixação de quantum como reparação de dano moral, a determinação do valor há que se fazer através de verba dotada de carga impositiva, em função das possibilidades do lesante e das condições do lesado, e sempre à luz das circunstâncias fáticas, como se vem observando na jurisprudência, a fim de que ganhe efetividade, na prática, o caráter inibidor do sancionamento”.

Este raciocínio é corroborado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que em julgados semelhantes tem ponderado a respeito do arbitramento dos danos morais, que deve seguir os postulados normativos de isonomia, razoabilidade e proporcionalidade, conforme transcrições a seguir:
“EMENTA: RECURSO ESPECIAL – RESPONSABILIDADE CIVIL – ACIDENTE EM PLATAFORMA DE EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO – MORTE DE FILHO – DANOS MORAIS – QUANTUM INDENIZATÓRIO – NÚMERO DE LESADOS – RAZOABILIDADE – RECURSO NÃO CONHECIDO.
1. Aos parâmetros usualmente considerados à aferição do excesso ou irrisão no arbitramento do quantum indenizatório de danos morais – gravidade e repercussão da lesão, grau de culpa do ofensor, nível socioeconômico das partes -, perfaz-se imprescindível somar a quantidade de integrantes do pólo proponente da lide. A observância da eqüidade, das regras de experiência e bom senso, e dos princípios da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade quando da fixação da reparação de danos morais não se coaduna com o desprezo do número de lesados pela morte de parente.
2. Ante as peculiaridades da espécie, a manutenção do quantum indenizatório arbitrado pelo Tribunal a quo, em valor equivalente a 500 salários mínimos para cada um dos autores, pais da vítima do acidente laboral, denota eqüidade e moderação, não implicando em enriquecimento sem causa.
3. Recurso Especial não conhecido.”
(REsp 745710 / RJ 2005/0068106-6 Ministro CESAR ASFOR ROCHA (1098) Relator(a) p/ Acórdão Ministro JORGE SCARTEZZINI (1113) T4 – QUARTA TURMA 05/12/2006 DJ 09.04.2007 p. 254)

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE ENTRE AS TESES CONFRONTADAS. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. INTOXICAÇÃO POR AGROTÓXICOS/INSETICIDAS. MORTE DE SERVIDORA FEDERAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO AJUIZADA PELAS FILHAS DA FALECIDA. DANO MATERIAL. DESPESAS COM FUNERAL QUE EXCEDEM O VALOR RECEBIDO A TÍTULO DE AUXÍLIO-FUNERAL. PENSÃO CIVIL. CUMULAÇÃO COM A PENSÃO ESTATUTÁRIA. DANO MORAL. ARBITRAMENTO. REDUÇÃO.
1. A interposição do recurso especial pela alínea “c” exige a comprovação do dissídio jurisprudencial, cabendo ao recorrente colacionar precedentes jurisprudenciais favoráveis à tese defendida, comparando analiticamente os acórdãos confrontados, nos termos previstos no artigo 541, parágrafo único, do CPC.
2. Consectariamente, visando a demonstração do dissídio jurisprudencial, impõe-se avaliar se as soluções encontradas pelo decisum embargado e paradigmas tiveram por base as mesmas premissas fáticas e jurídicas, existindo entre elas similitude de circunstâncias.
3. É assente que o quantum indenizatório devido a título de danos morais deve assegurar a justa reparação do prejuízo sem proporcionar enriquecimento sem causa do autor, além de levar em conta a capacidade econômica do réu.
4. A jurisprudência desta Corte Superior tem-se posicionado no sentido de que esse quantum deve ser arbitrado pelo juiz de maneira que a composição do dano seja proporcional à ofensa, calcada nos critérios da exemplariedade e da solidariedade.
5. In casu, o Tribunal a quo, considerando a responsabilidade objetiva da União pelo óbito de servidora federal, técnica de laboratório, intoxicada por agrotóxicos/inseticidas, sem que tenha havido caso fortuito ou força maior, ou culpa exclusiva da vítima, deu parcial provimento ao recurso interposto pela União para reduzir o valor arbitrado a título de dano moral, fixando-o em R$80.000,00 (oitenta mil reais) para cada Autor.
6. Em sede de dano imaterial, impõe-se destacar que a indenização não visa reparar a dor, a tristeza ou a humilhação sofridas pela vítima, haja vista serem valores inapreciáveis, o que não impede que se fixe um valor compensatório, com o intuito de suavizar o respectivo dano.
7. A modificação do quantum arbitrado a título de danos morais somente é admitida, em sede de recurso especial, na hipótese de fixação em valor irrisório ou abusivo, o que, in casu, não restou configurado.
8. Precedentes jurisprudenciais desta Corte: RESP 681482 / MG ; Rel. Min. JOSÉ DELGADO, Relator(a) p/ Acórdão Min. LUIZ FUX, DJ de 30.05.2005; AG 605927/BA, Relatora Ministra Denise Arruda, DJ de 04.04.2005; AgRg AG 641166/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ de 07.03.2005; AgRg no AG 624351/RJ, Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJ de 28.02.2005; RESP 604801/RS, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 07.03.2005; RESP 530618/MG, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ de 07.03.2005; AgRg no AG 641222/MG, Relator Ministro Fernando Gonçalves, DJ de 07.03.2005 e RESP 603984/MT, Relator Ministro Francisco Falcão, DJ de 16.11.2004.
9. Recurso especial não conhecido.”
(REsp 742175 / GO 2005/0061041-1 Relator(a) Ministro LUIZ FUX (1122) T1 – PRIMEIRA TURMA 18/10/2005 DJ 06.02.2006 p. 210)

Em relação aos danos morais, deve-se acrescer juros moratórios de 12% a.a (doze por cento ao ano), a teor do art. 962 do CC/1916 c/c art. 398 do CC/2002, fazendo incidir, outrossim, a partir da fixação do valor nesta decisão. Não há que se falar em correção monetária, uma vez os danos morais foram arbitrados em valores correspondentes ao salário mínimo vigente à data do pagamento.

Ante todo o exposto e acatando o parecer da Procuradoria de Justiça (fls. 157/160), voto no sentido de DAR PROVIMENTO PARCIAL ao presente apelo, condenando o Estado de Pernambuco ao pagamento de indenização por danos morais no valor correspondente a 100 salários mínimos legais, nos termos desse voto. Condeno, ainda, ao pagamento das verbas de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação.

É como voto.

Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo
Relator

Sétima Câmara Cível
Apelação Cível nº. 0122938-5 (2ª Vara da Fazenda Pública da Capital)
Apelante: Maurício de Abreu Pinto e OUTROS
Apelado: Estado de Pernambuco
Relator: Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. MORTE POR PERSEGUIÇÃO DE POLICIAIS MILITARES. VÍTIMA SUPOSTAMENTE PRATICANDO FURTO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. NEXO CAUSAL COMPROVADO. AÇÃO DESPROPORCIONAL AO FATO. DESNECESSIDADE DE INDIVIDUALIZAÇÃO DO SUJEITO CAUSADOR DO DANO. PEDIDO PARCIALMENTE PROCEDENTE. DECISÃO UNÂNIME.
1. Cidadão vitimado supostamente por policiais militares, em perseguição por uma possível prática de furto. Na fuga foi alvejado com um tiro pelas costas.
2. Sindicância e inquérito policial não individualizaram o(s) sujeito(s) causador(es) do dano, porém restou demonstrado pelos testemunhos colhidos, que foi a ação de policiais militares que resultou na morte de Marcel.
3. O Estado atua através de seus agentes, em razão disso o ato praticado por estes no desempenho da função ou em razão dela, é de responsabilidade da Administração Pública. Regra do § 6º do artigo 37 da Constituição da República.
4. A ausência de registro oficial da atuação de viatura nas proximidades do local do fato, não exclui a possibilidade de ter havido uma ronda no local por viatura que passava pelas imediações, a exemplo da viatura de prefixo 3800, que trabalhava no turno de 19:00 às 07:00, no setor de Boa Viagem, conforme planilha de fls. 57.
5. A possibilidade da polícia militar ter agido em legitima defesa própria ou em legitima defesa da ordem jurídica não deve prevalecer, pois somente é permitida pelo ordenamento jurídico quando pautada pela razoabilidade dos meios empregados que devem ser proporcionais ao perigo iminente.
6. Danos morais no patamar de 100 salários mínimos vigentes à data do pagamento, tendo como parâmetros o nível sócio-econômico das partes, a gravidade da lesão, o efeito sancionatório da medida e as circunstancias do fato.
7. Verba indenizatória apenas com incidência de juros moratórios nos termos do voto.
8. Apelo parcialmente provido, para condenar o Estado de Pernambuco ao pagamento de indenização por danos morais no valor correspondente a 100 salários mínimos legais e, ainda, ao pagamento das verbas de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da condenação. Decisão unânime.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0122938-5 da 2ª Vara da Fazenda Pública da Capital, em que figura, como apelante, Mauricio de Abreu Pinto e OUTROS e, como apelado, o Estado de Pernambuco, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 7ª Câmara Cível, por unanimidade, em DAR PROVIMENTO PARCIAL ao recurso, condenando o Estado de Pernambuco ao pagamento de indenização por danos morais no valor correspondente a 100 salários mínimos legais, nos termos desse voto e, ainda, ao pagamento das verbas de honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor total da condenação, em conformidade com as notas taquigráficas em anexo, as quais ficam fazendo parte integrante deste.

Recife, ___ de _________ de 2007.

Presidente

Des. Luiz Carlos de Barros Figueirêdo
Relator

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