Sentença em remissão reiteirada pelo procurador geral de justiça

16-04-2009 Postado em Sentenças por Luiz Carlos Figueirêdo

Processo nº 00196020298-7

S E N T E N Ç A Nº 0406/08/96-LCBF.

Vistos, etc…

O Órgão do Ministério Público, por sua Representante legal, representou de D.R.S, com 17 anos, pela pratica de infração penal narrada às fls. 02, em 12/04/96, com base nas peças de fls. 04 usque 37. Por outro lado, pelas razões mencionadas às fls. 03, o mesmo representante do “ Parquet ” optou por conceder a Remissão a E.S. e L.G.S., ambos com 16 anos, acrescentando que já providenciara a entrega do 2º aos genitores e que a mesma providencia deveria ser tomada em relação ao primeiro.

O Juiz auxiliar da Vara recebeu a Representação em 18/04/96, não fazendo qualquer menção às Remissões concedidas. Na audiência, realizada em 03/06/96, além da Apresentação de D.R.S, L.G.S. também foi ouvido, como se representado fora, inclusive lhe sendo nomeado Defensor.

Às fls. 45, a titulo de defesa prévia, a advogada nomeada oferece petição, falando na suposta autoria de Homicídio ( sic !).

As duas competentes, zelosas, dedicadas e exemplares profissionais que representam o Ministério Público perante esta Vara se pronunciaram às fls. 46/46v e 47, inclusive propugnando pela Custódia Provisória de L.G.S.

Às fls. 47/47v, exarei despacho apontando todos os equívocos existentes nos autos até então e a impossibilidade de decretar-lhe a internação provisória. Para viabilizar processualmente a justíssima pretensão das Promotoras, recusei-me a homologar a Remissão antes concedida, remetendo os autos ao Exmo. Sr. Procurador Geral de Justiça.

Às fls. 49, em 07/08/96, é juntado Ofício GPG nº 571/96, da autoridade antes referida, encaminhando PARECER ONDE RATIFICA A REMISSÃO.

Determinei vistas ao Ministério Público , que se pronunciou às fls. 53/53v, com a competência que lhe é peculiar, tomando ciência do parecer oriundo da Procuradoria, lamentando que, por força do mesmo, nenhuma medida sócio-educativa poderá se aplicar ao adolescente e apontando as danosas consequência que fatalmente irão advir para ele a partir daquele entendimento.

RELATEI E DECIDO:

Do ponto de vista processual, não há dúvida de que impõe-se a homologação, a teor do Artigo 181, parágrafo 2º, LECA. Não existe nenhuma novidade no mundo Jurídico, já que apenas reproduz sistemática existente no Código de Processo Penal para os maiores de 18 anos em pedidos de arquivamento.

Do ponto de vista material, o posicionamento apontado é lamentável sob todos os aspectos, como bem aponta a culta Promotora que oficia nesta Vara.

Como é amplamente sabido, o Dr. José Tavares é um dos grandes profissionais do Ministério Público Pernambucano, independentemente de transitoriedade de ocupação do Cargo de Procurador Geral. Tal como qualquer ser humano, tem limitações que o impede de conhecer profundamente sobre todos os assuntos. Para isso, tem que se valer de assessores em temas específicos. Apesar de ter na vizinhança um profissional super-especializado neste ramo do Direito, seu chefe de gabinete, o Procurador de Justiça Romero Andrade de Oliveira, parece que o Procurador Geral não pode contar com seu apoio neste processo, pelas suas múltiplas atividades, tendo que se valer de opinião de pessoa evidentemente leiga no assunto.
No caso concreto, o (a) assessor (a) que produziu o parecer ou não leu o processo direito; ou não entende patavina do assunto; ou é tão vaidoso (a) que se acha melhor habilitado (a) na função do que as 2 (duas) gabaritadas Promotoras que se pronunciaram às fls. 46/46v/47, ou, mais provavelmente, as 3 (três) coisas juntas. Lendo-se o curto parecer de fls. 50, tem-se a nítida sensação que esta pessoa estava querendo a todo custo ser contra o trabalho das eficientes Promotoras e deste Magistrado, voltado para corrigir as falhas detectadas no processo, sem se importar um minuto com o fato de que estaria expondo o nome respeitabilíssimo do Procurador Geral, que, afinal de contas, seria o signatário do parecer ratificador da Remissão, assumindo, assim, as responsabilidades do seu frágil conteúdo.

Independentemente da discussão de que a terminologia “Conceder a Remissão ” pelo Ministério Público é inadequada, e que melhor posto seria ali se contemplar “ propor ”, por exemplo, é inquestionável que sua eficácia fica condicionada à homologação pela autoridade Judiciária.

Para “ conceder ” a Remissão, o Dr. Promotor Djalma de Melo Câmara levou em consideração uma razoável convivência familiar; não participação direta na prática do ato infracional, primariedade.

Para prolatar uma Sentença relativa a apuração de ato infracional, mesmo que para a simples homologação de uma Remissão, o Juiz deve levar em conta: antecedentes, personalidade; circunstância e gravidade da infração; maior ou menor participação, etc.

Por este ângulo, é patente que o 1º Promotor que oficiou nestes autos laborou em equívoco, baseado em premissas falsas, provavelmente por não ter visto atentamente os elementos disponíveis nos autos, posto que:

a) L.G.S., na entrevista com o serviço técnico da Central de Triagem ( fls. 16, 31/32), confessa um roubo anterior; um furto de um colega abrigado no Oratório Dom Bosco, Jaboatão; 2 reprovações na escola, decorrente de expulsão por má conduta e agressão; usuário de drogas há 2 anos; por conflitos familiares, reside com um colega infrator; informou nome falso ao ser apreendido;

b) A vítima diz que foi abordada por 3 elementos e que os outros que não lhe tomaram a bolsa “ pelo menos apresentavam reações de ajudar o elemento abordante “.

Antes de pronunciamento do Judiciário sobre a concessão de Remissão, às fls. 39, diz o Representado D.R.S: “subtrair a bolsa da vítima, enquanto que E.S. e LG.S. seguraram a vítima, derrubando-a no chão logo em seguida “.

Disso decorre que só uma das premissas utilizadas pelo Promotor para conceder a Remissão era verdadeira: A Primariedade.

SE TUDO ISTO JÁ ESTAVA NOS AUTOS, seja ANTES DO 1º PROMOTOR SE PRONUNCIAR, seja antes da Autoridade Judiciária homologar a Remissão ( pelas regras processuais só cabe uma única sentença nos autos e o Juiz teria que esperar para fazê-lo junto com a decisão do adolescente que foi representado ), COMO SE FALAR EM “ Depoimentos Supervenientes ”.

Com a devida vênia, acho também equivocado falar-se em “depoimentos supervenientes”, sobre as declarações da tia e guardiã obtidas pela Promotoria às fls. 46. Superveniente ao pedido de Remissão, SIM; ao ato Judicial de homologá-lo ou remeter ao Procurador, NÃO.

Penso, data máxima vênia, que no pronunciamento do Procurador Geral optando por ratificar a Remissão ou providenciando a Representação, deve se levar em conta tudo que se encontrar nos autos até aquele momento processual, e não só as informações que o 1º Promotor dispunha ao pleitear homologação de Remissão, embora reconheça que uma interpretação formal, distante da realidade e feita por quem não tem sensibilidade para atuar nesta área leve ao entendimento diametralmente oposto ao meu. Só que este exercício interpretativo passa a quilômetros de distância da regra Hermenêutica do artigo sexto do Estatuto, representando a vitória de forma sobre o conteúdo. Além do mais, como já apontei antes, estas 2 (duas) posições de interpretação em nada aproveita o caso concreto, posto que os elementos recomendadores da Representação já estavam presentes nos autos quando da 1ª intervenção do Órgão Ministerial.

Como bem apontou a Promotoria, às fls. 53, L.G.S. vai continuar nas ruas, sem possibilidade de recuperação; Como já visto antes, vai continuar infracionando e usando drogas; Como já mostrado pela tia e guardiã ao Ministério Público , às fls. 46, vai continuar correndo risco de vida em função de sua conduta desviante, até porque em Recife, como é sabido, lamentavelmente, se mata menores com bastante frequência, sendo desconhecido um único caso de punição para os matadores.

QUEM SERÁ O CULPADO SE REALMENTE LG.S. FOR EXTERMINADO NOS PRÓXIMOS MESES, QUANDO, POR AMOR AO FORMALISMO, FOI RECUSADO A OPORTUNIDADE DE SER ELE SÓCIO-EDUCADO ?.

Como diz o ditado popular, no caso concreto cabe “amarrar o Burro onde o dono do Burro manda ”.

Quanto a E.S., por tudo que foi dito, há que, também, se homologar a Remissão.

No que se refere a D.R.S, o Ministério Público se pronunciou às fls. 40 pela Remissão cumulada com Liberdade Assistida. Acho que esta e a solução correta para o caso, embora não deixe de ser irônico, surrealista e bizarro que ele tenha que cumprir uma medida cumulada e L.G.S. não. Para isto resta 2 (dois) consolos. a) Sua participação na infração foi maior; b) com o acompanhamento assegurado no Programa Comunitário de Liberdade Assistida do Recife, hoje considerada modelo no Pais, terá enormes chances de recuperação, bem maiores do que as de L.G.S..

Ante o exposto, com arrimo no Art. 181, parágrafo 2º, “ In fine ”, do Estatuto, Homologo a Remissão concedida pelo Ministério Público aos adolescentes E.S. e L.G.S., e, com base nos Artigos 186, parágrafo 1º, 188; 126, parágrafo único; 127; 112. IV; 118 e 119, todos da Lei nº 8069/90, concedo a D.R.S. A REMISSÃO CUMULADA COM LIBERDADE ASSISTIDA PELO PRAZO DE 6 (SEIS) MESES, devendo ele e seus representantes legais serem intimados para comparecer ao Núcleo Gerencial de Medidas Sócio-Educativas em Meio Aberto deste Juízo, para entrevista e cadastramento e posterior encaminhamento à Entidade Cooperadora mais próxima de sua residência, prestando os relatórios previstos no respectivo termo de cooperação técnica.

Sem custas, ex-vi, do Art. 141, parágrafo 2º, LECA.

P.R.I., em, segredo de Justiça, remetendo-se cópia desta decisão, por Ofício, ao Exmo. Sr. Procurador Geral de Justiça.

Recife, 22 de Agosto de 1996.

Juiz da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Capital.

a) Luiz Carlos de Barros Figueirêdo.

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