OS REFLEXOS DA E.C.Nº45 EM MATÉRIA DE ADOÇÃO INTERNACIONAL

19-03-2009 Postado em Palestras por Luiz Carlos Figueirêdo

A EC N.º 45, de 31.12.2004, incluiu um parágrafo 3º no art. 5º da CF, com o seguinte teor:

“Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

§ 1º omissis;

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos outros princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte;

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.

O Brasil ratificou a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, concluída em Haia, em 29 de maio de 1993;

Em 01.07.1999, quando do início de sua vigência em nosso País (Dec. Legisl. N.º 01/99 e Dec. Pres. N.º 3.087/99), ESTAVA SEDIMENTADO NO STF o entendimento de que os Tratados e Convenções Internacionais equivaliam a uma “lei ordinária”.

O PROBLEMA

Qual entendimento sobre o limite de eficácia para os Tratados e Convenções sobre Direitos Humanos ratificados antes da EC N.º45?

Continuam equivalendo à Lei ordinária?

Equivalem a uma Emenda Constitucional se foram observados os requisitos formais e o quorum previsto na EC N.º45?

Em matéria de Adoção Internacional, as Comissões Estaduais estão tendo entendimentos divergentes, às vezes contraditórios no mesmo Estado.

O OBJETIVO DESTE TRABALHO

Como o STF ainda não se pronunciou sobre o tema após a EC N.º45 (apenas liminares em HC´s que não enfrentam a questão posta pelos impetrantes), e nem mesmo foi promovida ADPC em caso concreto de Adoção Internacional, a proposta é apontar e estudar as diversas opções, sob os aspectos jurídicos e políticos, tentando subsidiar opção do Conselho das Autoridades Centrais por uma delas, objetivando nortear a atuação comum em todos os estados.

(Atenção: mero indicativo, não vinculante)

1ª OPÇÃO
Não reconhecer efeitos “EX TUNC” à EC N.º45 (não retroage aos Tratados e Convenções anteriormente celebrados).

Fundamentos:
Foram elaborados sob a égide do antigo ordenamento constitucional mais restritivo quanto ao seu alcance; envolvem direitos e obrigações de outros Estados (Países), cidadãos brasileiros e estrangeiros (ato jurídico perfeito); seria irrelevante as questões de quorum e procedimento (formal e material); o tempo verbal contido no parágrafo 3º do art. 5º incluído este no futuro.

Isto apenas confirma a posição tradicional do STF, continuando a equivalerem a uma Lei ordinária.

Vantagens do seu acatamento:

Mantêm uma alternativa para viabilizar o Direito Constitucional à convivência familiar e comunitária para crianças/adolescentes que não puderam continuar na família natural, não tiveram adotantes brasileiros ou oriundos de Países que ratificaram a Convenção de Haia, desde que rigorosamente obedecido o escalonamento de preferência para pretendentes oriundos de Países ratificantes e, na falta deles, de candidatos vindos de Países que apenas assinaram a Convenção (ex. EEUU, Bélgica, etc.), tal como contido em diversas Resoluções do Conselho das Autoridades Centrais.

Desvantagens do seu acatamento:

A incompletude da aplicação da Convenção de Haia no Brasil perdurará até que outros Países cujos nacionais freqüentemente adotam crianças brasileiras decidam ratificar tal instrumento multilateral (a mercê dos estrangeiros);

Riscos de Desvio de Finalidade, transformando-se a exceção em regra e descumprindo-se o escalonamento determinado pelo Conselho das Autoridades Centrais.

Entender que os Tratados e Convenções anteriores à EC N.º45, com os requisitos e quorum nela exigidos têm eficácia imediata e, como tal, alçados à condição de equivalência a uma emenda à Constituição.

Fundamentos:

Todos os Tratados e Convenções Internacionais relativos a Direitos Humanos já são materialmente constitucionais (§ 2º, art. 5º da CF).

Conceito de Tratados de Direitos Humanos apenas materialmente constitucionais, e outros, material e formalmente constitucionais. O “status de equivalência à emenda Constitucional decorre não do “tempo” em que foi aprovado, mas de ter se submetido ao mesmo procedimento exigido para uma Emenda Constituição.

No caso em análise, a Convenção de Haia foi aprovada por unanimidade

Vantagens:

Plena eficácia da Convenção de Haia no Brasil;

Eliminação dos riscos de desvio de finalidade, pois só seria permitida adoção internacional para oriundos de Países que ratificaram a convenção;

Estimular a que Países que adotam no Brasil com freqüência, mas apenas assinaram a Convenção, venham a ratificá-la.

Desvantagens:

Elimina a possibilidade de adoção para um grande número de crianças (grupo de irmãos; raça negra; idade mais avançada; com problemas de saúde, etc.) que estão abrigados, condenando-os a ficarem no abrigo até maioridade, ante a impossibilidade de volta À família natural, ou adoção por brasileiros ou candidatos de Países que ratificaram a Convenção.

Para o caso de prevalecer no STF o entendimento de que os efeitos da ECN.º 45 incidem apenas em relação aos Tratados e Convenções Internacionais celebrados após sua vigência, mas a vontade política da Nação seja em alçar a Convenção de Haia ao patamar de Emenda à Constituição.

· Denunciar a participação brasileira na Convenção para, em seguida ao término do prazo de permanência – um ano, (re)ingressar como mero assinante, sucessivamente submetendo seu texto às 2(duas) casas legislativas e, caso aprovado com o quorum e formalidades da ECN.º 45, ratificar a adesão à Convenção de Haia, ou;

·Aprimoramento do texto do § 3º, art. 5º da CF.

Fundamentos:

Fórmulas jurídicas para elevar o campo de incidência e eficácia da Convenção de Haia em território brasileiro. A convenção não admite reservas e o Brasil nem mesmo tentou fazê-lo por ocasião do depósito de ratificação, submetendo-se, assim, as suas regras de validade;

O problema é fruto de defeituosa redação do art. 5º, §3º, da CF. (comparar com o art.75, §2º, Constituição da Argentina).

Vantagens:

Elevar dentro da hierarquia das leis um importante instrumento de direitos humanos;

Impedir adoção internacional para oriundos de Países não signatários da Convenção de Haia;

Inibir mudanças futuras no ordenamento jurídico do Brasil em matéria da adoção internacional.

Desvantagens:

Os prazos alargados para o alcance do seu desiderato;  

Desgaste externo desnecessário de imagem do Brasil no cenário internacional, por ser incomum “direito das gentes” a denunciar aos acordos multilaterais.

Sendo relevante que o Conselho de Autoridades Centrais indique uma Recomendação para todas as Autoridades Centrais Estaduais visando à uniformização de entendimento, para vigir enquanto não haja uma decisão do STF, à luz dos valores antes apontados, deverá ser providenciado, alternativamente:

Resolução Recomendando o entendimento de que os efeitos da EC N.º 45 não retroagem à sua publicação, possibilitando, portanto, no campo da Adoção Internacional, o seu deferimento a oriundos de países que não ratificaram a Convenção de Haia, desde que obedecida a preferência aos candidatos dos Países ratificante. 
Fundamento: os mesmos das Resoluções anteriores (feitos inter-partes dos tratados; regras do art. 227,§6º, da CF e do ECA).
OU
Resolução Recomendando o entendimento de que os efeitos da EC N.º45 retroagem a sua publicação, impedindo, por conseqüência, no campo da Adoção Internacional, o seu deferimento a oriundos de Países que ratificaram a Convenção de Haia.   Fundamento: por ficção jurídica, é como se estivesse contida na própria Carta Magna, suas regras são totalmente aplicáveis, mas apenas para os que participam do acordo multilateral. As regras do ECA não aplicáveis quando colidentes com as da Convenção.

Caso entendido como conveniente pelo Conselho das Autoridades Centrais, a questão poderia ser levada ao conhecimento do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, solicitando procedimento administrativo de Recomendações sobre o Tema, pelos seguintes fundamentos:

A questão é de âmbito nacional; as adoções no Brasil são constitucionalmente da competência do Poder Judiciário; as fases administrativas anteriores e posteriores à adoção são judicialiformes; o tema diz respeito ao próprio exercício da soberania brasileira;  

O CNJ tem existência por decorrência da Constituição (art.103, B c/c art.37), enquanto que o C.A.C. emerge de Decreto Presidencial (n.º3.147/99);  

Segundo seu R.I., o Plenário do Conselho tem competência para controle administrativo do Poder Judiciário, zelar por sua autonomia, podendo expedir atos regulamentares e Recomendar Providências, além de elaborar notas técnicas sobre normas de situações específicas da administração pública quando caracterizado o Interesse do Poder Judiciário(art. 16, caput, I e XXX);  

Precedente recentemente em um pedido do juiz da Infância e da Juventude de Cascavel-PR, onde o CNJ recomendou aos TJ´s estaduais a implantação de equipes técnicas.

Palestra apresentada em 25.05.06, em Brasília – DF, na REUNIÃO ORDINÁRIA DO CONSELHO DAS AUTORIDADES CENTRAIS, criada pelo Decreto Presidencial n° 3.174/99, ocasião em que foi DELIBERADO:

Rejeição, por unanimidade, de sugestão de encaminhamento da questão ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ;

Fixação de um prazo até 30.06.06 para que cada Comissão Estadual de Adoção se pronuncie optando, até pronunciamento definitivo do STF, por uma das 02 (duas) alternativas, a saber: 1) Não retroação do efeitos da EC n° 45 aos Tratados e Convenções relativos a Direitos Humanos celebrados antes de sua vigência; 2) Retroatividade dos efeitos da EC n° 45.

Criação de uma Comissão Especial encarregada de redigir a Resolução do Conselho das Autoridades Centrais Federais sobre o assunto, a partir do pronunciamento das Autoridades Centrais Estaduais, que se reunirá para tanto nos primeiros 10 dias de julho, em Brasília – DF, coordenado pelo Palestrante e composto de representantes do Rio de Janeiro, Ceará, Santa Catarina e Minas Gerais.